Depois
de nomear todos os “inúteis”, o tenente ordenou:
- Retirem todos os lixos de vocês de
dentro dos armários. Não toquem em nada que não lhes pertença. Um soldado irá
acompanhá-los. Depressa, depressa, depressa.
Saímos, comandados por um soldadinho que
só queria ser tenente, em direção aos alojamentos. Depois de recolhermos nossos
pertences, sob os gritos estridentes e nada amistosos do soldado, fomos
conduzidos em direção à saída do quartel. Determinado momento, inflando
vigorosamente as veias do pescoço, berrou:
- Alto!! Sentem-se no chão, cruzem as
pernas e curvem-se sobre elas. Sempre olhando pro chão.
Inicialmente, parecia fácil cumprir aquela
pena. Algum tempo depois, mais dois soldados juntaram-se ao outro que já estava
comandando o pelotão. Cada um armado com um FAL (Fuzil Automático Leve). Soltávamos
uns sorrisinhos tímidos e, imediatamente, éramos repreendidos pelos
sentinelas. Deveria ser mais ou menos 8h
e 30min quando fomos colocados em posição de estátuas naquela pista que nos
levaria à liberdade. O sol, impiedosamente, nos focava. A pista,
gradativamente, era aquecida. O suor começava, abundantemente, a escorrer pelo
corpo. A coluna vertebral começou a acusar dores e desconforto. Quando
tentávamos levantar a cabeça, um dos soldados apoiava a coronha da arma em
nossas costas e forçávamos para a posição de origem. As risadinhas sumiram.
Discretamente observando ao longe, comecei a ver aquelas “poças de água”
fumegantes na pista. Silêncio total no pelotão de fantoches. Só os coturnos dos
soldados, passeando cadenciadamente entre nós, eram ouvidos exaustivamente. Com
o tempo, não pensava mais em quase nada. Só no som das botas dos soldados: de
acordo com a distância do som, poderia desviar o olhar para os lados, para não
petrificar os olhos. Como não tivemos direito ao café da manhã, o intestino ecoava
infeliz. O almoço foi servido para toda a caserna, os nossos sentilenas foram
rendidos por outros e nós continuamos na penitência. Desesperadora. Respiração
ofegante, suor, fome, dores, pista escaldante e um tratamento como se fossemos
bandidos, deixava-me quase a ponto de fraquejar, mas, imediatamente, pensava:
se meus colegas suportam, eu também suportarei. Transgredir as ordens naquele
momento era cadeia na certa. No mínimo 15 dias.
Pois bem, entre as 13:00 e 14:00h,
chegou um oficial que não se identificou e iniciou, com todos nós na mesma
posição, um sermão improvisado e enxertado de palavras duras e impiedosas:
- Em primeiro lugar gostaria de dizer que
aqui vocês nunca existiram e, portanto, não deixarão saudades. Do portão do
quartel para fora, esqueçam tudo que vocês viram aqui. O que me deixa indignado
é saber que milhares de jovens desejam
servir ao exército brasileiro e, no entanto, vocês, frouxos e covardes
traidores, pedem para sair. Aqui dentro, seus miseráveis, vocês tem muito mais
do que em suas casas: três refeições, cama, disciplina, roupa, oportunidade de
ficar engajado, esporte, etc. No entanto, vocês renegam tudo isso para se
tornarem vagabundos. Como vocês são imbecis, vou traduzir: renegar significa
recusar. Para a pátria, vocês são escórias. Escória, seus semi-machos
analfabetos, significa resto, lixo. Isto mesmo: vocês são o lixo social. Não
servem para nada. Ou eu estou engano? Tem algum macho neste bando? Vocês não
formam pelotão, mas bando. Hoje, o Exercito Brasileiro fecha as portas para
vocês. Nunca comentem que já estiveram aqui, pois nunca foram dignos nem de
entrar nesta base. Saíam, traidores, e não olhem para trás: aqui é lugar para
homens de caráter e não para maricas como vocês.
Confesso: internamente chorei. Nunca tinha
me sentido tão ofendido e humilhado em minha vida. Afastando-se, o oficial,
dirigindo-se aos soldados, ordenou:
- Conduzam estes voadores até a saída.
Quando cruzamos, trotando, o portão de
saída, gritamos, jogamos as bolsas para cima, pulamos e pronunciamos palavrões
impublicáveis. Os oficiais foram xingados até a quarta geração.
20 comentários:
Me senti lá dentro do pelotão, kkkkk
é uma capacidade intrínseca ao bom escritor: fazer o leitor sentir-se.
Olá!
É com prazer que vou seguir seu blog.Adorei todos os textos.
Grande abraço
se cuida
saudades de vce bos
Vim, lhe trazer o meu Abraço.
Saudades, de voce
O mais importante: Um dos "inúteis" e "vagabundos" tornou-se professor universitário contrariando a hipótese do tal "oficial".
Um abraço fraterno, Antonio
Verdade Luiz. Nunca devemos nos envolver com sugestão orientada. Obrigado
Prof. Rodrigues, estou aguardando novidades no seu blog.
Adoro ler suas histórias.
Quero ler as novidades timonenses narradas por você.
Aguardo!
Passando para ler as novidades. Adooooro.
Fiquei sem fôlego ao ler Caserna Verde!
E que vontade de xingar os soldados também eu tive, pois parecia-me estar vivendo toda a situação narrada.
Parabéns meu querido amigo Antonio, é bem um Dr, na arte de narrar.
Lindo dia.
Grande abraço.
Belo texto como sempre professor.
Desculpe a ausência, nada justificável, porem... findada.
Como tens passado? espero que bem.
Um grande abraço!
Luciene Rroques
http://www.lucienerroques.blogspot.com.br/
Olá , passei pela net encontrei o seu blog e o achei muito bom, li algumas coisas folhe-ei algumas postagens, gostei do que li e desde já quero dar-lhe os parabéns, e espero que continue se esforçando para sempre fazer o seu melhor, quando encontro bons blogs sempre fico mais um pouco meu nome é: António Batalha. Como sou um homem de Deus deixo-lhe a minha bênção. E que haja muita felicidade e saude em sua vida e em toda a sua casa.
PS. Se desejar seguir o meu blog,Peregrino E Servo, fique á vontade, eu vou retribuir.
Prof. Voce sumiu, tava olhando os comentários pois só vou visitando aqueles mais urgentes pra respo nder, mas de vez enquando vou atras de todos e tava lá o seu, o professor dos contos militares, não esqueço das suas histórias muito boas com toda certeza.
Bom final de semana,
Um grande abraço!
Obrigado, Luciene. Não são contos, mas crônicas. Os fatos narrados são a minha história. Abraços
Serio professor, suas historias são suas mesmo? Achava qe somente aquele que falou do seu filho fosse sua historia. Falnado nisso voceês já estão juntos, ta tudo bem? Mas escuta aqui voce nao inventou esse militarismo todo de suas historias, voce os viveu de fato, eu nao pensava.
Um greande abraço excelente domingo.
Antonio José Rodrigues. Ola prof. um prazer falar contigo, gosto muito dos teus textos militares, parbéns por todos eles.Bom quanto a compra do livro já esta esgotado porem peço que me mande seu email pra gente ver o que faz tá?
Meu email: profebioluciene@hotmail.com
Um grande abraço!
22 de setembro de 2012 19:18
As histórias, Luciene, são verídicas. Vividas por mim. Agora estou mais próximo do meu filho: apenas 240km nos separam. Aguardo reimpressão do livro. Saudações
Gosto da sua companhia, estou mudando o meu blog, gostaria de estar com você em meu novo endereço. Passa lá.
Beijos
http://construir.daysesene.com/
Professor Um feliz natal e um excelente ano novo.
Um grande abraço!
Parabéns pelo livro. Sucesso. Você merece
Conto bem escrito, emocionante. Fico com ele para lembrar de uma caserna que nunca sofri. Minha carteira é de terceira categoria. E ainda achei bastante boa essa categoria. Tenho tirado primeiros lugares em concurso de contos e crônicas. Acho que o seu tiraria, se você se abalançasse a concorrer os concursos que fazem por aí.
abraços
francisco miguel de moura
Me gustan sus textos y la estructura general de su blog. Un cordial abrazo desde Madrid.
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