sala VIP

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Caserna verde: sonho e decepções - V

A noite, delirantemente suave e acolhedora, numa preguiça desesperadora, chegara.

Fomos encaminhados para o alojamento: grande galpão cheio de beliches. Algazarras e gritarias ensurdecedoras. Depois de um tempo, houve um toque de silêncio; um soldado cheio de arrogância fechou o portão; as luzes foram apagadas, mas as conversas cruzadas, como estações de rádio mal sintonizadas, tinham diferentes freqüências cheias de transientes (sujeiras de linha). Piadas de gostos duvidosos eram captadas, de quando em vez, pelos meus ouvidos. Fui acomodado na cama inferior do módulo, na superior, tinha um aspirante a soldado enjoado, chato, grosseiro, provocador e metido a chefe de grupo. A maioria se calava: o cara não tinha cérebro, mas tinha músculos intimidadores. Eu, com o corpo tremendo involuntariamente em função dos exigentes exercícios, só respondia o que me perguntavam. De súbito, o cara embalava o beliche, contava histórias sem conteúdo, sorria espalhafatosamente por qualquer besteira e, de propósito, sem nenhum objetivo, descia pela escada da estrutura e, portanto, chacoalhava-me. Eu acordava assustado e ficava em estado de transe, pois estava entorpecido pelo cansaço e meio desnorteado com o lugar. Depois de um tempo, levantei-me. Saí do alojamento e fiquei a caminhar pelo beiral. Decidi esperar todos dormirem.

De chofre, deparei-me com um pequeno grupo de recrutas agachados nos fundos do alojamento, na entrada de um matagal, fumando maconha e consumindo álcool. Fiquei paralisado, estarrecido. Um dos elementos do grupo interrogou-me:

- E ai, cara, quer dar um “tapa”?

- Obrigado, não fumo!

- Ah, então veio tomar uma dose? – disse estendendo-me uma garrafa.

- Obrigado, hoje não vou beber: estou cansado!!

- Se tu tá cansado, porra, então o teu lugar é na cama e não dando uma de espião!

- Desculpem-me. Não foi a minha intenção.

Sorrateiramente, retirei-me. Fiquei a pensar que aquela cena era corriqueira: fui recebido com muita naturalidade. No alojamento, depois de tombar madrugada adentro, adormeci cheio de interrogações.

59 comentários:

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

Não sei definir o sentimento que sinto, pelo "recruta"- assim são chamados, no meu Ceará, aqueles rapazinhos que completam 18 anos e "servem" às forças armadas -
Agora, lendo seu relato, bateu esse sentimento dolorido...É pena, ou o quê?
Estava sentindo falta dos seus escritos, amigo Antonio...
Um Beijo

Laís Araújo disse...

É incrível como vc descreve situações simples se tornarem assim tão bom de ler!

beijos

Anônimo disse...

Que situação, querido, dividir a beliche com um grandalhão mal educado e intimidador!!!!

Terá continuação? Se tiver, a estória promete...

Beijos, querido e um lindo fim de semana.

Aleatoriamente disse...

Nossa Antonio, sempre fico impressionada quando leio teus textos.
Intenso d+!
Muito bom.

Beijo Antonio.
Fernanda

Valeria Soares disse...

Bela crônica!

Bom fim de semana"!

Ira Buscacio disse...

Querido Antonio,

Na vida sempre existem caminhos mais sórdidos. Uma questão de escolha.
Bjão e um fds bem bacano

Antonio José Rodrigues disse...

LÚCIA, chamavam,também, na minha época, recruta. Hoje, não sei qual é o vocábulo pejorativo que define os aspirantes a soldado. Obrigado pela visita. Beijos


LAÍS, estava sentindo falta de suas visitas. Muito obrigado. Beijos


PAROLE, não é estória, mas história: sou o protagonista. Leia, por favor, o desenvolvimento de minha estadia no exército. Beijos


FERNANDA, obrigado. Só consigo expressar bem o que vivi. Fiquei inflado com o seu comentário. Beijos


VALÉRIA, obrigado pela visita. Fico lisonjeado por ter gostado. Beijos


IRA, minha poetisa fascinante, fico honrrado com a sua presença. Beijos

Quintal de Om disse...

Prendo meu olhar em cada linha, em cada palavra, tendo a sensação que se eu piscar, perderei uma grande revelação escondida ou que fica de canto de olho bisbilhotando-me.
Cativa-me seus escritos, seus delírios, esses caminhos que descreve com uma perfeição de fazer vibrar.

te admiro muito, querido.
Meu carinho,
Samara Bassi.

Anne Lieri disse...

Antonio,não se fazem mais soldados como antigamente!Teu companheiro de beliche parece-me mesmo um bobo alegre e esses caras fumando maconha e bebendo em pleno exército,é deploravel essa atitude!Fez bem em se afastar!Grande história!Bjs a vc e ao Jones!

José María Souza Costa disse...

Antonio, tenho admirado muito a sua narrativa. Confesso que leio sempre. Às vezes cometo a falta de educação de não deixar nenhum comentário. Mas, confesso ainda mais, que prestigio sempre e sempre.
Um abraçõ

Jorge Jansen disse...

Se sentiu o próprio soldado perdido na guerra...Quem é o inimigo????
Abraços

Aleatoriamente disse...

Passando para deixar um beijo.
Bom domingo querido.

Fernanda

Luciene Rroques disse...

Escrever é dom lapidado. Aqui sua vida simplismente esculpida, muito bom de ler. Parabéns.
Um abraço!

Lauro Pedot disse...

O texto instiga reflexões! Fiquei pensando sobre a vaidade humana...O "post" é muito bom! Ótimo! Um abraço!

João Vitor Fernandes disse...

E será que ainda existe isso no exercito brasileiro? Acho que sim.


Abraços JOsé!

Ira Buscacio disse...

Antonio, meu querido
Passando pra te deesjar uma bela semana, bjão

Vivian disse...

Bom dia,Antonio!

Que coisa!!Tem isso em todo o lugar!!
E pensar que os filhos vão para estes alojamentos...a base tem que ser bem sólida!
beijos pra ti!
Boa semana!

Antonio José Rodrigues disse...

SAM, suas palavras deixaram-me a flutuar. Obrigado. Beijos


ANNE, muito obrigado pela visita e por lembrar-se do seu leitor mirim, o Jones. Beijos


JOSÉ, a vida dinâmica muitas vezes nos trai e, portanto, nem sempre fazemos o que planejamos. Obrigado. Abraços


ANA, muito obrigado. Muitas vezes a vida nos leva à deriva de sonhos e projetos. Beijos


JORGE, no exército vencia o mais sagaz ou o mais malandro. Obrigado. Abraços


FERNANDA, obrigado. Felicidades. Beijos


AMANDA, fiquei honrrado com a tua visita. Visitar-te-ei em breve. Obrigado. Beijos


LUCIENE, muito obrigado. Quando a gente vive o fato, fica fácil de descrevê-lo. Obrigado. Beijos


LAURO, saudades. Obrigado por retornar. Abraços


JÃO, hoje, infelizmente, não sei responder a sua perguunta. Eu não duvido de nada: meu relato é em pleno regime militar. Abraços


IRA, obrigado por tirar uma fração do seu tempo para visitar-me. Beijos tropicais


VIVIAN, hoje não mais como estão as casernas. Obrigado. Beijos

Nina Linhares disse...

Infelizmente nos deparamos sempre com tal situação.
Mas temos inteligência suficiente para não nos misturarmos.

=D

bjokas

Nina

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

Você hoje me emocionou, no comentário, lá na "cadeirinha"...
Comentei, em resposta. Veja lá,
sobrando um tempinho.
Boa e produtiva semana, Antonio.
Um cheiro, bem cearense...

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

Antônio, fiz um comentário, há pouco, mas parece que se perdeu, que nem as "memórias" rsrs.
Vim dizer que seu comentário me emocionou...sinto que você compartilha com as idéias, com o que se propõe, na siplicidade da vida...
Deixei, na "cadeirinha", um comentário, em resposta ao seu de hoje.
Boa e produtiva semana
Um chero, bem cearense

Aleatoriamente disse...

Olá Antonio, gostei do poema.
Obrigada querido.
Um beijo e tenha uma linda terça-feira moço.

Beijo.
Fernanda

Anne Lieri disse...

Antonio,voltando para reler sua história e agradecer seu gentil comentário em meu blog!Bjs,

Luciene Rroques disse...

Bela frase, lá no meu espaço, grata!
Um abraço.

Maria Auxiliadora de Oliveira Amapola disse...

Boa noite, querido amigo José.

Nossa... Se isso for corriqueiro, valha-me Deus!!
Viajei nas suas palavras.

Um grande abraço.
Tenha uma linda semana de paz.

Andréya Rosa disse...

É. A QUESTÃO É..
Será que permanecem assim?
Creio que sim.
Existem coisas que não mudam.
Apenas seguem mudando os personagens
os fatos continuam os mesmos...

beijos querido !

Obg pelas palavras deixadas la no meu viver...

Evanir disse...

Conhecendo seu blog hoje.
Gostei muito da sua postagem ao meu ver a Alma do blog.
Estou seguindo você convido a conhecer o meu .
beijos ,Evanir..
www.aviagem1.blogspot.com

Elcio Tuiribepi disse...

OLá amigo..essas histórias podem lhe render um livro...matrial com certeza você já tem...
Um abraço na alma

Antonio José Rodrigues disse...

NINA, nesses momentos somos envolvidos pelo adágio popular: "Diga com quem andas e eu direi quem és". Obrigado. Beijos


LÚCIA, obrigado. Visitei a sua página. Beijos


FERNANDA, obrigado. Beijos


ANNE, sinta-se em casa. Estarei sempre a lhe fazer sala. Beijos


LUCIENE, estou honrado com o seu reconhecimento. Beijos


AMAPOLA, obrigado pela visita. Pois é, Maria, não sei se continua como prática. Beijos


DÉYA, hoje não sei avaliar, mas acredito que não mudou muuita coisa.Obrigado. Beijos


EVANIR, obrigado. Pode contar com mais um seguidor. Beijos


ÉLCIO, estou arranjando fôlego para concluir um livro técnico. Quiçá um dia eu as condense em um livro. Abraços

Majoli disse...

Antonio, brigadinha pelo carinho no Rabiscos.
Feliz por saber que a música que escolhi, te agradou, eu a acho linda demais, até choro quando ouço.
:)

Preciso vir aqui me atualizar, faz tempo que não te leio.
Mas andei meio afastada, entregue...mas preciso levantar, sacudir a poeira e dar volta por cima, certo?

Beijos de uma deliciosa noite.

ONG ALERTA disse...

O ser humano esta cada vez mais complicado, beijo Lisette.

Aleatoriamente disse...

Antonio, obrigada por todo aquele carinho comigo.
Nossa! fiquei emocionada, tão lindas foram tuas palavras.
E euzinha amei!

Obrigada querido.
Beijo
Fernanda

vanessa cony disse...

Antonio,me senti lá, juntinho do seu personagem.
Parabéns.
Beijo no coração.

Ira Buscacio disse...

Bom, hj é sexta e to passando pra te desejar um fds bem bacana.
Bj, meu querido amigo

Maria Auxiliadora de Oliveira Amapola disse...

Boa noite, querido amigo Antonio José.


Muito obrigada pela honra da sua visita. (Eu também nunca tinha ouvido nada parecido com aquela experiência)

Um grande abraço.
Tenha um lindo fim de semana, cheio da paz de Cristo.

Joelma B. disse...

Sem net em casa, Antônio... Beijinho e ótimo fim de semana!

Aleatoriamente disse...

Antonio, meu querido amigo.
Vim te deixar um beijo e desejar um sábado maravilhoso.

Beijinho
Fernanda

José María Souza Costa disse...

Tenhamos todos um dia das Mães, harmonioso.
Abraços. E um final de semana agradável.

JAIR FEITOSA disse...

Aí de dia saem em patrulha, quando na fronteira, em busca de traficantes de drogas.

Me lembrei do cara da TV que filmava a apreensão de mais de um quilo de cocaína. Depois perguntado pelo policial matreiro, que sabia ser o cara da TV cheirador da bicha, o que ele achou daquilo que estava vendo. Aí o cara disse: "Que pena, jogar tudo isso no mato. E eu aqui doido para dá uma cafungada".

São fatos AJRS, que nos fazem ver quem somos.

Um abraço.

Jair Feitosa.

Unknown disse...

Antonio, lendo mais esse capítulo de sua humaníssima Caserna Verde, concluo que o desejo de todo menino é mesmo o de ocupar a parte mais alta do beliche, para dormir mais perto da constelação de sonhos do teto.

Sonia Parmigiano disse...

ANTONIO,

GRATA SEMPRE POR SUA VISITA!!
ÓTIMO TEXTO, PARABÉNS!

QUE ESTE DIA DAS MÃES LHE TENHA SIDO ESPECIAL!

UMA BOA SEMANA.......BEIJOS!!!

REGGINA MOON

"Eu sei que todos os dias quando eu acordo Deus dá um sorriso e me diz: Estou te dando a chance de tentar de novo..." (Caio F. Abreu)

Aleatoriamente disse...

Ei moço, desculpa a ausência, correria de provas, trabalho, data comemorativa.
Mas cá estou para te deixar um beijo Antonio.
Apressada também.

Beijinho
Fernanda

VELOSO disse...

ADORO Contos e crônicas evocê é um grande crônista! Parabens amigo!

Vivian disse...

Bom dia, Antonio!!

Vim deixar um beijo e um abraço!!
Ótimo dia pra ti!!

Tempestade disse...

Olá vim agradecer a visita no blogue "Flores no Caminho", e te convido a conhecer o meu novo blogue.

http://sentimentosmarculinos.blogspot.com/

e também minhas escritas.

http://devaneios-fragmentos.blogspot.com/

abraços
Nina

Luciene Rroques disse...

Belas frases como sempre Antonio. Agradecida eu.
Um abraço!

Aleatoriamente disse...

Oi meu amigo querido, que saudades!
Mas enfim, tudo voltou ao normal.
Vim te deixar um beijo Antonio.

Com carinho.
Fernanda

Ira Buscacio disse...

Antonio querido,
Passando pra te desejar um lindo fds.
Bjão

Antonio José Rodrigues disse...

MAJOLI, obrigado. A vida é melhor quando estamos sempre reinventando. Beijos


LISETTE, estamos cada vez mais desumanizados. Beijos


FERNANDA, obrigado. Sou apenas espontâneo. Beijos


VANESSA, obrigado pela visita. Não é um personagem, sou eu mesmo. Beijos


IRA, obrigado por sempre ter um tempinho para visitar-me. Beijos poetisa


AMAPOLA, são os mistérios que não conseguimos explicar. Beijos


ANA LUZ, compreendo. Vc faz belíssimas poesias. Beijos


JOSE MARIA, obrigado. A recíproca é verdadeira. Abraços


JAIR, são os ópios do ofício. Abraços


ROBERTA MENDES, sempre prefiro uma posição discreta e intermediária. Beijos


REGGINA, obrigado pelo texto. Beijos


VELOSO, agradeço a sua presença. Obrigado pelas palavras. Abraços


VIVIAN, obrigado. Beijos


NINA, obrigado. Quanto fôlego vc tem para manter tantos blogues. Beijos

Anônimo disse...

Triste saber que não é ficção e realmente passou por tudo isso.

Beijos de ótimo domingo.

ONG ALERTA disse...

Um domingo de paz.
Beijo Lisette

Maria Auxiliadora de Oliveira Amapola disse...

Passei para lhe dar um abraço de Boa Noite.

Muito obrigada pela atenção e gentileza.

Tenha uma linda semana de paz.

Majoli disse...

Brigadinha pelo carinho de sua visita Antonio.
Beijos!!!

Anne Lieri disse...

Antonio,passei para dizer olá e agradecer seu gentil comentário em meu blog!Bjs,

Aleatoriamente disse...

Por céus e mares eu andei,
Vi um poeta e vi um rei
Na esperança de saber
O que é o amor.

Ninguém sabia me dizer,
Eu já queria até morrer
Quando um velhinho
Com uma flor assim falou:

O amor é o carinho,
É o espinho que não se vê em cada flor.
É a vida quando
Chega sangrando aberta
em pétalas de amor.

(Vinícius de Moraes)

Antonio,
estava com saudades meu amigo.
Beijinho
Fernanda

Dayse Sene disse...

Ser obrigado a conviver com pessoas mal-educadas, nos causam um mal terrível.
Ainda mais quando estamos cansados, com uma vontade louca de descansar o corpo.

Mas a sua narrativa é perfeita meu amigo...adorei.
Um grande abraço e saudades de você em meu blog. Você é sempre muito bem-vindo por lá.
Uma bela noite.
Um grande abraço.

Anne Lieri disse...

Antonio,muito obrigada pela sua solidariedade em meu blog!Fiquei mesmo triste pela minha gatinha,mas vamos nos conformando e ficam as boas lembranças!Bjs,

Luciene Rroques disse...

Agradecida Antonio por tuas sempre muito bem vindas palavras.
Um abraço!

Luna Blanca disse...

Os poetas não são azuis nem nada, como pensam alguns supersticiosos, nem sujeitos a ataques súbitos de levitação. O de que eles mais gostam é estar em silêncio - um silêncio que subjaz a quaisquer escapes motorísticos e declamatórios. Um silêncio... Este impoluível silêncio em que escrevo e em que tu me lês.

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