
Pedi ao condutor do veículo que, por favor, diminuísse a velocidade. Imediatamente, meio assustado, perguntou-me se eu estava sentindo dores. Respondi que não, mas fiquei com vergonha de confessar que estava feliz. Apenas, gostaria que aquelas cenas não fugissem tão rápido: era sublime viver aquele momento. Determinadas coisas, a gente não pode reportar a outro homem senão, de canto de olho e com trejeitos no rosto, começa a gozação pejorativa e depreciativa: “Virou boneca, heim!”; “A viadagem tá solta!”; “Eu botava tanta fé em você!”; “Tá doída pra voar, gazela!”; etc, etc, etc... Rótulos cotidianos da educação machista. Queria apenas fazer uma curvatura no parâmetro tempo para que a minha felicidade demorasse mais alguns segundos.
De volta ao novo mundo, a minha decisão estava abalizada: o casamento seria o meu próximo itinerário de vida. Eu não estava com pressa em viver enigmáticas experiências, mas a lógica do meu furtivo mundo seduzia novos paradigmas comportamentais.
Na pequena janela do meu pretérito, onde transitava folgada a minha ignorância sobre a vida, não passava a minha maturidade e, portanto, desconstruí conceitos estilizados que inflavam o caricatural ego.
Ao passar pela farmácia, minha mãe comprou várias caixas de cada medicamento indicado pelo médico. Em casa, o meu quarto estava impecável. A janela aberta soprava liberdade e vida. Como aquela casa era extraordinária! Quantas coisas feéricas cabiam dentro dela e eu, embriagado com torpes eflúvios da vida, nunca tinha percebido: amor, fraternidade, esperança, alegria, coragem, determinação, etc, etc, etc. Tudo transbordando por portas, janelas e frechais. Tudo ao meu alcance!
Depois de cinco dias que tomava os medicamentos, resolvi suspendê-los. Não sentia dores agudas e, portanto, telefonei pro médico e perguntei se, mesmo não sentindo nada, era obrigatório o uso dos remédios que me deixavam com um odor nauseante. O médico, num tom debochado, grosseiro e zombeteiro, disse-me: “Se tu não tá sentindo nada, porra, vai tomar remédio pra quê?” Foi a primeira e última vez que liguei pra ele. Desde aquele prosaico sábado de 1998, nunca mais tomei aqueles antibióticos.
P.S: A minha intenção inicial, inclusive o título dos textos não me deixa mentir, era falar sobre as minhas experiências de casamento até a fase de separação, mas o acidente não deixou o tema vingar e, portanto, fiquei convencido de que ainda não estou emocionalmente credenciado para discorrer sobre o assunto.