sala VIP

terça-feira, 18 de agosto de 2009

a janela



É noite. A febre das paredes do apartamento irrita-me. Meu corpo incha nesta estufa numerada - aptº 202. As paredes comprimem-me. Então, a minha solidão começa a escorrer pelas frestas da porta e pelos recortes venezianos da janele, a fluir sem viscosidade para a rua.
Meu vulto esquipático e frágil desce a escadaria. Ganho a rua. O vento esvoaça a minha camisa de tecido ordinário. A rua deserta acusa-me: sou um perfeito marginal errante. Paro diante de um edifício: uma janela, no décimo segundo andar, brilha solitária. O prédio espeta o espaço cinzento e apoético e as suas arestas afiadas cortam, neste instante, a minha solidão. A sombra do prédio estendida no chão não mostra a janela solitária, no entanto, independente da angústia que pode estar se escondendo atrás dela, continua alegre, quiçá gozando do desespero humano. Estou envergonhado. Encaro a janela como uma nova abertura para a vida; uma nova esperança que, nas noites sombrias, ficará sorrindo da cidade. Cidade que, na sua estaticidade, fica a consumir, geralmente de emboscada, a vida humana.
Estou cansado. É noite.
Campina Grande(PB), 1985

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